domingo, 10 de agosto de 2014

Vagão

Eu nunca sei bem como começar uma coisa quando estou apática. Começa mesmo ao me levantar e pergunto-me: Pra que mesmo eu abri meus olhos grandes, ainda pequenos e cambaleantes, na manhã de luz cinza?! Pra que mesmo meu cérebro latejante despertou (agora)?! E junto com ele essas dores incessantes que correm dos olhos até a nuca, se distendendo como um espreguiçar. 
Mesmo assim dou bom dia às paredes e sigo num dia sem graça, a colorir-se ou não, mais tortuoso que qualquer outro das semanas que se seguiam. Com toda aquela merda de confusão que você me causa, e mesmo assim aguardo com ternura pela hora que falarás comigo. E às vezes não acontece. E fica aquela azia condensada e parece (pra você) que nada aconteceu no dia anterior. É, deve ser a sua suprema concentração. Então prefiro me dispersar de você e de tudo que eu penso. Tem faltado pouco.
Quis fazer um caminho diferente quando saí daquele antro de conhecimento e assim foi. Passar pelas flores é o que mais gosto. São tão coloridas e diferentes que atiçam minha mente positivamente. Ou às vezes nem isso, e foi o que aconteceu. Naquele dia somente uma planta/flor (não sou botânica) me chamou atenção, somente curiosidade. Nenhuma alegria como nos outros dias. 
Passou o metrô lá pelas seis e tantas; adentrei. Sentei. Observei como sempre faço. Fico imaginando o estado de humor e a história de cada pessoa que adentrou, como eu, ou que espera paciente ou não, na estação. Por um instante em nada pensei. Parecia até que eu prestava atenção na conversa de dois senhores a minha frente, mas nada ouvia; minha mente era brisa de silêncio. Devia ser a dipirona querendo calar aquela bagunça, que mais acima chamei de cérebro. Saí do transe pouco depois. Embasbaquei-me. Como não tinha notado aquela presença enquanto observava o nada?
Volto-me então ao pensamento de Larissa: "E quem nunca quis viver um amor de metrô?". Não sou lá muito certa enquanto alguns quereres, mas enquanto àquele eu não conseguia produzir muito mais coisa que uma fixação de olhar e um sorriso cortado de lado segurado desde o piloro do estômago. Já não sabia como segurar. 
Observei quando estavas de pé atrás daqueles dois senhores que mencionei, mas não dei de ombros porque eu era o vazio do meu pensamento. Minha mente vaga, vagava entre todos os vagões do meu pensamento. Por todo o descarrilar das últimas semanas e pela mercadoria estragada. Amor ou coisa assim.
Passara para meu lado esquerdo. Não notei as passadas. Parecera teletransporte. Como nos filmes da Audrey Tautou, minha eterna Amèlie, parecera só uma cena engraçadinha e terna de filmes francês. Com direito a biquinho e umas 3 palavras em francês. Eu só quis dizer merci.
Até que sentou do outro lado, quase em frente ao meu banco. Um ou dois lugares de diferença. O lugar perfeito para aquelas escapadelas de olhares, meio que de soslaio. Me contive. Olhei umas duas vezes. Poderia ser pega em breve, e fui. Perdi a dimensão do tempo e fui encarada de volta rapidamente e também com um riso segurado. Eu também ganhara os mesmos olhares de soslaio, a mesma incapacidade de esconder o sorriso com um bico. E eu ri tanto. Fora a coisa mais feliz de todo o meu dia. E saí. Passou. A realidade que me aguardava era outra, menos flor.
Eu poderia descrever tal personagem com maestria, mas preferi manter sua pele alva; a calça social de um corte não tão bom ou de cor duvidosa; os óculos; a pasta carteiro e sua presença tímida, mas importante, resguardados no meu pensamento. Fora breve.




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